Prezados Clientes,
Conforme destacado no informativo anterior sobre o tema COVID-19 e os impactos trabalhistas, as considerações anteriores tinham por base legislação e documentos oficiais publicados até o dia de 18 de março de 2020; entretanto, no dia 22 de março de 2020, foi publicada a Medida Provisória nº 927, que dispõe sobre as medidas trabalhistas para enfrentamento do estado de calamidade pública já reconhecido e da emergência de saúde pública de importância internacional.
Diante da referida Medida Provisória, o tratamento a ser dispensado pelos empregadores aos seus empregados neste período terá um novo paradigma.
Há de se destacar que a Medida Provisória em análise tem, em seu artigo 1º, o objetivo de sua adoção, qual seja, dispor sobre medidas trabalhistas que poderão ser adotadas pelos empregadores para preservação do emprego e da renda, as quais passamos a explicar.
1. ACORDO INDIVIDUAL ESCRITO (art. 2º): empregado e empregador poderão celebrar acordo individual escrito, a fim de garantir a permanência do vínculo empregatício, tendo este instrumento prevalência em relação aos demais instrumentos normativos, legais e negociais, tendo como parâmetro os limites da Constituição Federal. Informações importantes são retiradas deste dispositivo, visto que o acordo a ser pactuado deve ser necessariamente escrito, deve conter garantia de emprego e respeitar limites constitucionais. Ou seja, caso empregado e empregador pretendam pactuar acordo individual escrito para regulamentar o período de calamidade pública que estamos atravessando, este deve garantir o mínimo previsto constitucionalmente, entendendo-se que deverá ser mantido ao menos o salário mínimo em favor do empregado, por exemplo. Contudo, como esta parametrização com base no mínimo constitucional pode dar margem à interpretação e colocar o empregador exposto a riscos de passivo trabalhista, sugere-se que haja a opção por uma dentre as outras medidas expressas na MP nº 927.
2. TELETRABALHO (art. 4º e 5º): fica dispensada a existência de acordos individuais ou coletivos, bem como o registro prévio da alteração no contrato individual de trabalho para adoção deste regime contratual, ficando a critério do empregador alterar o regime de trabalho de presencial para teletrabalho, trabalho remoto ou outro tipo de trabalho a distância. Importante destacar que esta alteração contratual deverá ser comunicada ao empregado com antecedência mínima de 48 (quarenta e oito) horas, por escrito ou por meio eletrônico.
No prazo máximo de 30 dias a contar da mudança do regime de trabalho, as partes deverão pactuar contrato escrito prevendo (i) a responsabilidade pela aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho à distância e (ii) o reembolso de despesas arcadas pelo empregado.
Caso o empregado não possua equipamentos tecnológicos e infraestrutura necessários e adequados à adoção do regime de trabalho à distância, o empregador poderá fornecer os equipamentos em regime de comodato e pagar por serviços de infraestrutura, sem que estes valores tenham cunho salarial.
Salvo previsão em acordo individual ou coletivo, o uso de aplicativos e programas fora da jornada de trabalho não constituem tempo à disposição, regime de prontidão ou sobreaviso, ou seja, não haverá computo desses períodos para fins de pagamento de horas extras, uma vez que são inaplicáveis ao teletrabalhador (art. 62, III, CLT).
É possível adoção de teletrabalho, trabalho remoto ou à distância para estagiários e aprendizes.
Sendo assim, observa-se que a MP nº 927 alterou os requisitos de adoção do regime de teletrabalho previsto no art. 75-C da CLT, facilitando a sua adoção neste momento pandêmico.
3. ANTECIPAÇÃO DAS FÉRIAS INDIVIDUAIS (art. 6º e seguintes): o empregador poderá conceder férias individuais aos seus empregados, desde que os informe com no mínimo 48 (quarenta e oito) horas de antecedência, por meio escrito ou eletrônico, com indicação do período a ser fruído. Sendo assim, o prazo mínimo de formalização do aviso de férias que é de 30 dias, previsto no art. 135 da CLT, não será aplicável às férias concedidas no período de vigência da MP nº 927.
Referidas férias poderão ser concedidas mesmo que o período aquisitivo correspondente ainda não tenha se consumado e não poderão ser gozadas em período inferior a 5 (cinco) dias corridos.
Antecipação de períodos futuros de férias também podem ser efetuados neste momento, desde que por meio de acordo individual escrito entre empregado e empregador.
Os empregados enquadrados nos grupos de risco do COVID-19 serão priorizados para o gozo das férias.
O empregador poderá suspender as férias ou licenças não remuneradas dos profissionais da área de saúde ou daqueles que desempenhem funções essenciais, mediante comunicação formal da decisão ao trabalhador, por escrito ou por meio eletrônico, preferencialmente com antecedência de quarenta e oito horas.
O abono pecuniário de um terço das férias eventualmente requerido pelo empregado estará sujeito à concordância do empregador, bem como, que este seja efetuado com no mínimo 48 (quarenta e oito) horas antes do início da sua fruição.
O prazo para pagamento das férias concedidas em decorrência da pandemia do COVID-19 será até o quinto dia útil do mês subsequente ao início do gozo das férias; ou seja, não há pagamento antecipado das férias, como prevê o artigo 145 da CLT.
O empregador pagará, juntamente com o pagamento dos haveres rescisórios, os valores ainda não adimplidos relativos às férias em caso de rescisão contratual havida neste período.
4. CONCESSÃO DE FÉRIAS COLETIVAS (art. 11 e 12): desde que respeitado o prazo mínimo de 48 (quarenta e oito) horas entre a notificação e o início da fruição, o empregador poderá, a seu critério, conceder férias coletivas aos seus empregados.
A notificação das férias poderá se dar em conjunto a todos os empregados.
As férias coletivas concedidas no período de vigência da MP nº 927 não sofrerão os limites previstos no § 1º, do art. 139, da CLT, o qual transcrevemos:
Art. 139 – Poderão ser concedidas férias coletivas a todos os empregados de uma empresa ou de determinados estabelecimentos ou setores da empresa.
§ 1º – As férias poderão ser gozadas em 2 (dois) períodos anuais desde que nenhum deles seja inferior a 10 (dez) dias corridos.
Não se faz necessário informar previamente ao Ministério da Economia nem ao sindicato da categoria a concessão das férias coletivas.
As formas de pagamento das férias coletivas adotam os mesmos parâmetros das férias individuais, ou seja, (i) o pagamento do terço constitucional das férias concedidas neste período poderá ser efetuado após sua concessão, até a data em que é devida a gratificação natalina (20 de dezembro 2020); (ii) o prazo para pagamento das férias concedidas em decorrência da pandemia do COVID-19 será até o quinto dia útil do mês subsequente ao início do gozo das férias; ou seja, não há pagamento antecipado das férias, como prevê o artigo 145 da CLT.
5. APROVEITAMENTO E ANTECIPAÇÃO DE FERIADOS (art. 13): a MP nº 927 traz a possibilidade de, por decisão do empregador, antecipar-se o gozo dos feriados desde que (i) os empregados sejam notificados (por escrito ou por meio eletrônico) com antecedência de 48 (quarenta e oito) horas, (ii) os feriados a serem aproveitados sejam expressamente indicados e, (iii) para feriados religiosos, que o empregado concorde mediante acordo individual escrito.
6. BANCO DE HORAS (art. 14): a MP nº 927 prevê a possibilidade de constituição de regime especial de compensação de jornada, por meio de banco de horas, em caso de interrupção das atividades pelo empregador.
O banco de horas deverá ser pactuado por meio de Acordo Coletivo de Trabalho ou Acordo individual escrito, cuja compensação se dará em até 18 (dezoito) meses, contados da cessação do estado de calamidade pública.
A compensação deverá ser feita respeitando a mesma lógica do banco de horas previsto no artigo 59, § 2º da CLT, ou seja, a compensação das horas negativas lançadas no respectivo banco os empregadores deverão respeitar o limite diário de até 10 (dez) horas, ou seja, se um empregado tem jornada diária de 8 (oito) horas, poderá trabalhar até 2 (duas) horas a mais por dia, com a finalidade de compensar as horas não laboradas que integraram negativamente o banco de horas.
7. DA SUSPENSÃO DE EXIGÊNCIAS ADMINISTRATIVAS EM SEGURANÇA E SAÚDE NO TRABALHO (art. 15 e seguintes): durante o estado de calamidade pública, os exames médicos ocupacionais, clínicos e complementares deixam de ser obrigatórios, devendo ser realizados no prazo máximo de 60 dias a contar do encerramento do estado de calamidade pública.
O exame demissional, como regra, continua sendo obrigatório, exceto se tiver sido realizado exame médico ocupacional há menos de 180 (cento e oitenta) dias.
Os treinamentos periódicos e eventuais dos empregados, no período da calamidade pública, tiveram sua obrigatoriedade suspensa. Deverão ser realizados no prazo máximo de 90 (noventa) dias a contar do encerramento do estado de calamidade. Contudo, se houver viabilidade, o empregador poderá realizar referidos cursos na modalidade de ensino a distância, cabendo ao empregador observar os conteúdos práticos correspondentes, de modo que sejam executadas com segurança.
Em relação às Comissões Internas de Prevenção de Acidentes (CIPA), estas poderão ser mantidas até o encerramento do estado de calamidade pública, bem como, eventuais processos eleitorais em curso poderão ser suspensos.
8. DO DIRECIONAMENTO DO TRABALHADOR PARA QUALIFICAÇÃO (art. 18): já houve manifestação do Presidente da República que este artigo da MP nº 927 será revogado.
9. DIFERIMENTO DO RECOLHIMENTO DO FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO DE SERVIÇO (art. 19 e seguintes): fica suspenso o recolhimento do FGTS pelo empregador, das competências de março, abril e maio de 2020 (que possuíam vencimento, respectivamente, em abril, maio e junho de 2020).
O pagamento destas competências poderá ser quitado pelos empregadores em até 6 (seis) parcelas mensais, iniciando em julho de 2020, sem qualquer atualização, multa ou encargo.
Para usufruir o empregador deve declarar as informações até 20 de junho de 2020, independente de (i) adesão prévia, (ii) regime de tributação, (iii) quantidade de empregados, (iv) ramo de atividade e (v) natureza jurídica.
Caso haja rescisão do contrato de trabalho, o empregador fica obrigado ao recolhimento dos valores correspondentes, embora sem incidência de multa e encargos.
10. OUTRAS DISPOSIÇÕES EM MATÉRIA TRABALHISTA (art. 26 e seguintes):
à Aos estabelecimentos de saúde, mediante acordo individual escrito, fica autorizado (i) a prorrogação da jornada de trabalho além do limite legal ou pactuado entre as partes, bem como (ii) a adoção de escalas em horas suplementares entre a 13ª (décima terceira) e a 24ª (vigésima quarta) hora do intervalo interjornada, sem que haja penalidade administrativa, mantendo-se garantido o repouso semanal remunerado. As horas suplementares prestadas poderão ser compensadas, no prazo de 18 (dezoito) meses, contado da data de encerramento do estado de calamidade pública, por meio de banco de horas ou remuneradas como hora extra. Entende-se que para ter validade, esta situação deverá ser pactuada por meio de Acordo ou Convenção Coletiva de trabalho, nos moldes exigidos pelo art. 7º, XIII, CF.
à Ficam suspensos por 180 (cento e oitenta) dias, a contar as entrada e vigor da MP nº 927, os prazos processuais para apresentação de defesa e recurso no âmbito de processos administrativos originados a partir de autos de infração trabalhistas e notificações de débito de FGTS.
à Os casos de contaminação pelo COVID-19 não serão considerados ocupacionais, exceto mediante comprovação do nexo causal.
à Em relação aos Acordos e Convenções Coletivos de Trabalho vencido ou vincendos no prazo de 180 (cento e oitenta) dias a contar da entrada em vigor da MP Nº 927, poderão ser prorrogados a critério do empregador, por 90 (noventa) dias.
à As medidas trabalhistas adotadas por empregadores, tomadas no período dos 30 (trinta) dias anteriores à 22/03/2020, que não contrariem o que nela foi disposto, consideram-se convalidadas.